quinta-feira, 14 de julho de 2011

Fim. Mas todo fim é um começo!

Não, não vou parar com o blog. Apenas anuncio mudanças!

Devido a problemas técnicos com o blogspot, mudei o endereço do blog para outro servidor, o wordpress.

Anotem o novo endereço, e terá um post la mais longuinho para ser lido.

apenassorriaeacene.wordpress.com

Abraços, Dreamer (ou simplesmente Vitor)

domingo, 26 de junho de 2011

"#protesto" e "Respeito Atropelado"

Depois de algum tempo em recesso, vou mudar um pouco as coisas. Saindo um pouco do estilo de texto comum que publico aqui, vou comentar duas manchetes interessantes que saíram em revistas nesse fim de semana.


                A primeira é a notícia da Carta Capital, #protesto, que trás o subtítulo: “Convocados pela internet e sem a medição de partidos ou sindicatos, manifestações explodem de Norte a Sul”.

                Pois bem, a revista trata do mesmo assunto que eu tratei aqui em outros dois textos, e sem dúvida começa agora a causar cada vez mais debates. E não faltam exemplos trazidos pela notícia: Revolta de Jirau, Greve dos Bombeiros, Marcha da liberdade, a revolta em Vitória, e por ai vai. E em todos estes movimentos faltam aquilo que até agora parecia essencial para fazer política: sindicatos ou partidos.
                Esta falta de líderes trás alguns receios. Até que ponto é realmente possível organizar um grupo, exigir reivindicações e ter importância política sem uma hierarquia, sem representantes? O medo é sempre a barbárie. O medo é que um grupo, uma massa – sem a direção clara a seguir – cultive mais os sentimentos irracionais do que os racionais. A Carta Capital trouxe, por exemplo, uma entrevista aonde o entrevistado afirmou que a revolta em Jirau saiu do controle, pois nem os trabalhadores sabiam ao certo o que eles queriam.
                Talvez seja errado sair do pressuposto de que qualquer grupo sem liderança resulte na barbárie. Talvez seja muito errado. Mas é preciso alguma boa estrutura que tome o lugar do líder; do partido político; do sindicato. Não basta levar um bando de gente pra rua e sair gritando; não basta fazer uma revolta sem saber o que reivindicar. Não que este tenha sido o caso em Jirau (eu não estava lá pra saber), mas sem duvida é um caso muito passível de acontecer. O desafio, agora, é achar um sistema justo que de conta de suprir aquilo que a carência de uma liderança proporciona.
                Possível, certamente é. Ou pelo menos eu espero que seja. Mas é sem dúvida um desafio para estas manifestações, para este novo grupo de insatisfeitos importados diretamente do facebook e do twitter.
                Tomara mesmo que renasça nos adolescentes a perspectiva de mudança política. Tomara mesmo que as novas ferramentas on-line, tão difíceis de serem entendidas pela rapidez com que criam, transformam, e destroem, resultem em alguma mudança positiva. Mas isto ainda vai demorar algum tempo. Mas será o tempo “real” ou o tempo “digital”?
                Além disso, como diria meu professor de história (que nenhum adjetivo da conta de descrever): “Não há revolução sem teoria”. E eu diria mais: “Não há revolução sem teoria e tão pouco sem organização”.
               



A segunda notícia, PASMEM LEITORES, é da revista Veja São Paulo. Isso mesmo: eu estou trazendo uma matéria que saiu na tão odiada Veja, aquela que tem 2pgs de propaganda pra 1pg de notícia.

                Respeito Atropelado. Opiniões jornalísticas sobre o título e o modo de escrever aparte, trata-se de uma análise crítica da nova campanha da CET de educação no trânsito. Campanha esta que prega o respeito ao pedestre, principalmente no referente a faixa de SEGURANÇA. SE-GU-RAN-ÇA. “Estado, qualidade ou condição de seguro”. SE-GU-RO: “Livre de perigo; Livre de risco; Protegido; Acautelado; Garantido”. Todos os motoristas entenderam o que significa FAIXA DE SE-GU-RAN-ÇA?!
                Pois bem, agora podemos continuar:  a reportagem trás uma análise crítica desta nova campanha. E, na verdade, mete o pau neste nova campanha. E cara, apesar de se tratar da Veja, não é que a reportagem levante pontos muito interessantes?
                Até agora, tudo o que eu tinha ouvido sobre a nova campanha eu tinha achado legal. Respeito a faixa de pedestre, educação do motorista, mudança de hábito. São coisas boas. Mas a maneira é como fazer isto, e ao que parece, a prefeitura escolheu uma maneira incerta. A revista afirma, e faz sentido: a campanha da CET foca muitas vezes em cruzamentos com semáforo de pedestre. Acontece que o respeito a estes cruzamentos já existe! Não é comum algum carro passar no sinal vermelho (pelo menos, não durante o dia). Acontecer, acontece, mas não é o grande problema. O grande problema é a faixa de segurança que não é segura!
                Nestas faixas, a ação da CET foi colocar uma pessoa com uma cancela, que coordena a passagem de carros e pedestres, e vem escrito “respeite a vida”. Ou seja: a pessoa é um farol inteligente. Então, ao invés de respeitar as faixas sem farol, a CET colocou temporariamente um farol humano ali. Quando o “farol” sumir, o respeito some junto.
                Além disto, a campanha é tão falha que não propõe nem o cumprimento do código de transito, que afirma que desrespeito a faixa de pedestre é multa gravíssima, com 7 pontos na carteira. Não faz parte da campanha uma onda de fiscalização do respeito a faixa de pedestre, passível de punição para os infratores. Se a repressão financeira não é a única ferramenta para ensinar bons hábitos, é no mínimo importante. Querer que os motoristas adquiram este habito sem doer no bolso, desculpem-me quem discorda, é otimismo.
                As pessoas não tem noção que desrespeitar a faixa de pedestre é colocar em risco a vida de alguém. É pior que passar no sinal vermelho. Porque se dois carros se chocam, há toda uma proteção de metal feita para proteger o motorista. Mas se um carro bate numa pessoa, que proteção esta tem? Nenhuma. Então quem me explica o avanço no sinal vermelho ser passível de uma quantidade enorme de multas, e o desrespeito a faixa de pedestre – que coloca mais em risco a vida alheia – não render nem uma multa? É burrice. Burrice esta que a campanha não consegue resolver.

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Áurea


                Recentemente, este blog passou de um simples espaço para tentar problematizar o cotidiano – através dos meus textos e dos comentários que as pessoas (não)fazem – e tornou-se também meu projeto de redação.
                Funciona assim: eu escrevo como já escrevia antes, por vontade e risco próprio, e, depois de publicar no blog, imprimo uma cópia e levo para minhas aulas de redação de quarta feira, aonde coloco-as em uma pequena pasta (de que cor será? Não me lembro) aonde formam um conjunto. Na semana seguinte, na mesma pasta, as folhas voltam corrigidas e com nota.
                Se eu fosse uma criança eu acharia até que a pasta é mágica. Basta deixar a folha ali, que, quando ninguém estiver vendo – tal com era o papai Noel antes desta mania de se vestir do velinho começou – a mágica acontece sem ninguém ver, e a redação está logo corrigida. Pois bem: criança não sou mais, e tenho plena possibilidade de usar minha super capacidade de pensamento cognitivo (adoro esta palavra, meu professor de história que usou outro dia) para concluir empiricamente que as folhas não se corrigem por mágica. Tão pouco existe um duende corretor, como aquelas que roubam nossas meias e tampinhas de caneta BIC. Trata-se de uma pessoa com a mesma capacidade de pensamento cognitivo que eu. E, se até o ano passado essa pessoa era o meu então conhecido professor de redação, este ano – por influencia do temido vestibular – tudo mudou. Agora, esta sequencia de textos que aqui escrevo terá o privilégio de ser lida, analisada e adaptada ao português gramaticalmente correto por uma corretora, de nome Áurea.
                Não é louco pensar nisto? Estou escrevendo para uma mulher, cuja o nome eu descobri por acaso recentemente, e ela irá ler e corrigir.
                Como será ela? Ela deve usar óculos. Não deve? Sei lá, sempre que me vem na cabeça a figura de alguém mais culto com a língua portuguesa está pessoa esta usando óculos. É um ícone: acho que eu mesmo, se fosse passar boa parte de minha vida lendo e corrigindo textos, usaria um óculos, ainda que de mentirinha, mas para criar o estilo. Mas, pensando bem, nós vivemos na era do politicamente correto, e talvez eu tenha cometido uma gafe acima. Será que qualquer dia desses, depois do texto ser lido pela Áurea, tocara minha campainha a Associação dos Usuários de Óculos (AUO) ou a Associação dos Corretores Sem Óculos (ACSO)? Ambas podem se enfurecer bastante com meus comentários preconceituosos a cerca da necessidade do uso do óculos como iconografia de alguém culto na língua portuguesa.
                Mas... deixemos isto de lado, antes de criar mais polêmica sobre o assunto. Voltemos a figura que, daqui a quatro dias (ou a 3 anos atrás, dependendo do lugar que você, leitor, ocupa no tempo) vai corrigir meu texto. Onde será que ela mora? Não deve ser muito longe: São Paulo é gigante, mais a São Paulo dos privilegiados tem uns 10 bairros no máximo. Cara, já pensou se ela é minha vizinha? Se é aquela moça chata do condomínio (que usa óculos), que eu sempre arranjo briga? Isto pode trazer conseqüências em minhas notas caso ela descubra o meu verdadeiro eu. Por segurança, melhor eu fazer as pazes com todas as moças do condomínio. Vai que é, né?
                Mas sabe o que é mais estranho? Mais metafísico? Mais pirado ainda? É pensar que ela vai estar corrigindo um texto que fala dela mesma – ou melhor – fala de uma imagem dela.
                Ok, talvez as pessoas não acompanhem meu entusiasmo com este fenômeno. Mas ainda assim é bem maluco pensar que um dos meus temas de redação seja a figura abstrata da mulher chamada Áurea que vai ter de corrigir uma redação sobre ela própria feita por um moleque que ela não conhece e que criou uma imagem preconceituosa (ou não) dós óculos que ela deve usar porque é culta em língua portuguesa e se quer teve criatividade para imaginar o resto de sua cara ou de seu corpo, atendo-se apenas aos óculos. Xii, será que ela vai entender o sentido deste parágrafo quase sem virgulas?
                Mas, se ela esta lendo isto, talvez fosse educado eu dizer oi... Certo?
                Então... Oi! Tudo bom? Você usa óculos?
                Cara, o que será que ela vai responder? Será que vai responder? Ou ira se prender a sua função de somente corrigir? Gostaria muito de saber se ela usa óculos.
                Queria poder colocar a resposta aqui, caso houvesse, ou anunciar a ausência de uma. Mas, como meu espaço no tempo não permite isso, fica para a próxima.
                Boa noite/tarde/dia Áurea! (que horas será que ela corrige? Eu ia chutar a noite, mas vai que amanha me aparece a Associação em Defesa aos Corretores Diurnos na porta do meu apartamento!...)

domingo, 29 de maio de 2011

Algo esta mudando, ou eu estou sonhando.

                Era 1992, e centenas de milhares de estudantes tomara a avenida paulista, com suas caras pintadas, com uma única exigência: Fora Collor!. E o Collor se foi.
                Vai fazer 20 anos desde que a ultima grande manifestação estudantil tomou forma em São Paulo. Desde então, houveram cada vez menos grande manifestações na paulista, e o movimento estudantil parecia entrar definitivamente em decadência. Eu vivo esta época, em que protesto e manifestação significa, para o paulistano, transito e maconheiros sem vergonha.
                Mas algo esta mudando. No começo deste ano, um grupo de estudantes tomou as ruas por 13 vezes. Centenas de milhares de estudantes? Longe disso: apenas 2mil por passeata, em média, chamando o povo para ir as ruas contra o aumento absurdo da tarifa de ônibus. Depois de 10 quintas feiras seguidas de manifestação, o movimento se apagou, sem sucesso.
                Ao mesmo tempo, no começo do ano, um movimento nacional ameaçou surgir contra o abusivo aumento salarial dos parlamentares, de quase 70%. A faísca se apagou depois de levar algumas poucas centenas de estudantes as ruas em 5 capitais diferentes do Brasil simultaneamente.
                No M’boi mirim, aonde a carência do transporte urbano desta cidade atinge um pico, já foram no mínimo 3 manifestações diferentes levando reivindicações à sub-prefeitura.
                Chegamos ao presente mês, maio, quando vimos uma mudança do local do metrô Higienópolis causar um churrasco de gente “diferenciada” no centro de um bairro de elite; e, quase em seguida, a violenta repressão a Marcha da Maconha (um absurdo ridículo) dar luz a Marcha da Liberdade, que ocorreu no último sábado, com algo entre 2mil e 5mil presentes.
                É impressão minha, ou parece que algo esta mudando?
                Estamos longe, MUITO longe de chegar aos 100mil estudantes de cara pintada que tomaram a Paulista. A verdade é que era uma outra época, com uma outra cultura, com uma outra mentalidade, com uma outra juventude – a juventude que, hoje, parece ter chegado a vida adulta e se esquecido de como se manifestar. Mas neste ano, os políticos, principalmente nosso ilustríssimo prefeito Kassab, devem ter coçado a cuca e começado a se perguntar: que diabos esta acontecendo?  Porque estas pessoas estão vindo encher meu saco?
                Sem dúvida, parte da culpa é da internet. Ou melhor, dando nome aos bois: boa parte da culpa é do facebook. Já tratei deste assunto aqui em outro texto, enquanto comentava a revolta Egípcia, e volto a repetir: esta ferramenta deixou incrivelmente fácil marcar uma manifestação. Panfletos que nada: basta criar um evento e convidar todos seus 1000 amigos, que vão chamar mais 100 amigos cada, e o efeito cascata esta feito.O estrago esta feito: nada vai cancelar este protesto. Este efeito é tão assustador que apavorou até mesmo o criador do churrascão de gente diferenciada, que ao ver o tamanho que a coisa tomou arreou o pé.
                As manifestações, que cada vez mais vem tomando a mídia e, consequentemente, atraindo mais gente, estão se tornando cada vez maiores e mais freqüentes.
                Elas continuam restritas a uma relativamente pequena parte desta elite mais intelectualizada, que forma a grande parte dos manifestantes (ou, como preferem chamar os conservadores, bando de maconheiros sem ter o que fazer). E é por isto que as reivindicações ainda levam pouca gente para as ruas. Mas os policias estão tendo cada vez mais trabalho em reprimir, digo, proteger as manifestações.
                É cara, os políticos que se cuidem. Porque quando a reivindicação for por alguma causa mai ampla – alguma carência maior que se estenda mais profundamente na sociedade – vai ser como ascender a ponta de um fio ligado a diversos barris de pólvora. Porque quando a massa estudantil perceber como é bom estar em um grupo, nas ruas, com uma revindicação justa nas mãos, vai ser difícil segurar.
                Será sonho meu? 

quarta-feira, 25 de maio de 2011

A hierarquia

Lily era ema cadela golden retriver. Vivia no bairro de Higienópolis, bairro chique da elite paulistana, muito embora ela mesma não soubesse disto – sabia ela apenas que aquele portão alto, com um cheiro muito peculiar que misturava ferro, um outro pigmento qualquer e, claro, o seu cheiro, era o lugar que os humanos chamavam de “casa”. Quando sentia o cheiro de algum outro cachorro, Lily sentia-se brava, e logo recuperava o espaço perdido.
                Sabia ela também que o cheiro de vários adolescentes e suas mochilas, que estudavam ao lado; daquela grande arvore que cheirava bem e, as vezes, derrubava uma fruta perto dela; dos porteiros que estavam sempre ali na entrada e abriam o portão para ela; todos aqueles cheiros formavam sua rua. Tinha ainda os cheiros que Lily não gostava, como o do bueiro (claro que Lily não fazia idéia que aquilo era um bueiro).
                Mas Lily era muito astuta. Ela conseguia se lembrar de todos os cachorros que moravam ali perto dela pelo cheiro. E sempre que percebia a aproximação de um deles, ela logo começava a balançar o rabo. Queria cheirar, brincar, conhecer, ver, latir, pular, perseguir e balançar seu rabo junto com o outro cão. Ela pulava freneticamente, impulsionando seu corpo para frente, mas era barrada por um fio que Lily odiava e que segurava seu peito. Era um fio que sua Dona prendia nela sempre que iam passear. Pouco sabia ela que aquele fio chamava coleira.
                Lily não sabia, nem poderia com sua percepção de cão, mas para os humanos sua Dona tinha classe social, etnia, e sobrenome conhecido. Dona Alda, como era conhecida – e Lily sabia disso vagamente, já que suas experiências haviam conectado o nome a pessoa – era um dama herdeira – muito endinheirada e vivendo de renda. De humanos, Lily também conhecia Antônio, que era o porteiro do prédio, João, que era o sobrinho de Alda e estudava ao lado, o Zé, que era um cara da padaria que fazia carinho nela, e alguns outros. De cachorro, Lily conhecia um com cheiro engraçado, outro com cheiro forte, um outro que era meio doce. Todos era do tamanho de Lily, e da mesma raça.
                Claro que ela não sabia da parte do sobrinho, da padaria, do porteiro. Ela conhecia apenas os cheiros.
                Mas, enquanto passeava, Lily passava por um outro ser. Ela sabia que não era um cachorro, não cheirava como um. Mas, mesmo com sua visão preto e branco, que transforma o mundo em borrões de cinza com contornos, Lily sabia que ele não era humano. Talvez algo de seu cheiro fosse semelhante – e isso por muito tempo a enganou – mas agora ela tinha certeza, pois nenhum humano era daquele jeito – ficava apenas deitado ou sentado na rua.
Seu cheiro era forte, e Lily desejava que ele fosse ao pet shop tomar um banho, como ela fazia, para depois ser escovada, e sair dali com uma fitinha presa na cabeça. As vezes, ela ganhava até uma massagem! Mas ela sabia que, se aquilo não era um cachorro, ele não poderia ir num pet shop. Apenas cachorros como Lily podiam fazer isto. Pet shop para aquele ser estava completamente fora de questão; fora de alcance.
Mas Lily desejava que ele tivesse uma Dona como a dela, que lhe desse colo, comida, um lugar quentinho para dormir, visitas ao pet shop, e biscoitos quando ela merecia. Porque será que ninguém queria aquilo? Lily não sabia. Mas também não importava: ela destinava 5seg de sua atenção para a figura ali no chão, para então continuar sua caminhada. No caminho, se chorasse bastante, talvez ainda conseguisse que sua dona a comprasse um pão de queijo quentinho da padaria. E como ela gostava de pão de queijo.
E Lily podia não saber que aquilo chamava pão de queijo, e que o lugar chamava padaria, e que o bairro chamava Higienópolis. Podia também não saber que aquela figura chamava-se mendigo. Não sabia, alias, que todas as figuras semelhantes levavam este mesmo nome. Mas Lily era muito astuta, e até ela – sem contar com a incrível capacidade de pensamento cognitivo dos humanos – percebia o óbvio: ela, enquanto cadela da Dona Alda, era muito mais importante e superior a aquele ser deitado no chão, ao qual ninguém dava comida e banho.
Lily foi dormir cheirosa e contente.

terça-feira, 17 de maio de 2011

A hipocrisia refletida no espelho

Peço desculpas para aqueles que não estudam no Equipe, pois este é um texto que talvez não faça sentido sem o contexto do cotidiano da escola.  Obrigado.




Darwin foi um genio. Ele descobriu a palavra chave para desafiar a religião e a ciência da época e buscar uma explicação inesgotavelmente plausível para a evolução dos seres humanos: diversidade.
                A diversidade é uma coisa engraçada. Ela da conta de que, dentro de uma mesma espécie, possam haver diversas diferentes entre eles. Não é genial? Os seres são iguais mas... Ao mesmo tempo, são diferentes!
                Até desenvolvermos a capacidade do pensamento cognitivo, isto não era problema. A diversidade era fundamental para garantir a seleção natural e, assim, a continuidade da espécie.
                Mas nós chegamos ao ser humano que somos hoje. Pensamos, criamos, matematizamos. Nossas mentes evoluídas são capazes de coisas incríveis. Aí, a diversidade mudou de característica. A seleção natural, se ainda tem efeito sobre os seres humanos civilizados, não dita mais todas as regras como antigamente. A diversidade criou um novo problema: o preconceito, o segregacionismo.
                Mas nós somos seres incríveis. Depois de anos de servidão; escravidão; massacres étnicos e duas guerras mundiais, a humanidade (mesmo pelos motivos errados, e mesmo que não como um todo – bem longe disto) começou a falar uma nova palavra: respeito. Foi uma evolução incrível: descobrimos que, no fundo, a ciência afirma que somos todos iguais e que talvez seja possível vivermos em sociedade juntos. Não precisamos nos amar, apenas respeitar.
                Essa é a palavra chave. Respeito.
                Há diversidade em todo lugar. E não é diversidade física, mas principalmente diversidades ideológicas; diferentes maneiras de pensar e agir. A capacidade de pensamento cognitivo trás consigo este problema: nem todos pensam igual. Problema? Na verdade, uma benção.
                Mas, cada vez mais, o colégio equipe me surpreende. Surpreende porque, quando minha classe foi viajar para Cubatão, estávamos falando sobre conceitos de Agnes Heller, uma filosofa que discutia muito sobre o cotidiano. E, lembro-me muito bem, quando eu estava em uma das grandes plenárias em que discutíamos estas questões, relacionadas com toda a desumanização e a falta de respeito que havíamos visto em Cubatão, eu olhei para trás e fiquei assustadoramente emocionado.
                Porque não foi o discurso dos trabalhadores contaminados que me emocionou. Tão pouco os discursos sindicalistas de luta de classe. Tão pouco Agnes Heller. O que me emocionou foi olhar para trás e olhar aquele bando de pessoas, cerca de 70, todas concentradas e reunidas ali em um único objetivo; discutir tudo isto. Refletir, pensar, discutir. Tomar consciência de sua própria alienação. Foi um daqueles momentos que, depois de ter certeza de que o mundo é uma bosta, você percebe que ali do seu lado estão 60 mentes em formação que pararam e se concentraram para discutir estas questões. E você pensa que, enquanto estes momentos existirem, talvez o mundo ainda possa ser um lugar melhor. E lá, tenho certeza, todos entendiam muito bem o que é respeito.
                Passado o momento, a volta para São Paulo trousse de volta o cotidiano. E o que fazemos com toda aquela reflexão, discussão, percepção que havíamos feito e construído? Guardamos para a próximo momento de discussão. Ali, no cotidiano, na escola, aquilo tudo vira lixo. Lixo inútil, sem sentido.
                Nós, 3º anistas, inclusive eu, temos SÉRIOS problemas de respeito. Não conseguimos respeitar os professores, que se esforçam para dar aula e, algumas vezes, não conseguem. Não conseguimos respeitar o trabalhador, que depois de toda a aula, é obrigado a limpar as carteiras que sujamos, o lixo que produzimos, e ainda limpar desenho de maconha do banheiro e da parede. Não conseguimos respeitar a escola, pois a maioria das situações propostas por ela são má vistas logo de cara. Não conseguimos respeitar todo o colégio, quando depreciamos o espaço público da escola com pixações e todo outro tipo de depreciamento. Não conseguimos respeitar o colega ao lado, quando fazemos barulho nas aulas, quando trocamos ofensas idiotas, quando fazemos piada de situações inapropriadas; quando não damos ouvido a alguém, quando queremos apenas procurar culpados sem sequer olhar no espelho e se desculpar. Não conseguimos respeitar todos os alunos quando furamos a fila da cantina. Não conseguimos respeitar as outras séries quando jogamos interclasses e entramos pra quebrar. Não conseguimos respeitar o segundo ano por algum tempo, com todo o rolo da festa. Em nosso cotidiano, o desrespeito parece assustadoramente normal, e esta palavra já foi invocada no mínimo por três professores..
                Isso é regresso. É involução. Não adianta ser consciente somente nas viagens de campo e aulas de filosofia. Tenho medo de usar esta palavra, mas para mim nós vivemos o cúmulo da hipocrisia.
                Outro dia, quando me recusei a ajudar alguém a furar a fila da cantina, fui chamado de moralista.
                Chamem-me do que quiser. Mas insisto: as relações construídas em nossa classe cheiram a hipocrisia, alienação, e em seu caráter mais puro, idiotice e egocentrismo.
                Respeitar é preciso.

Desabafei.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Cadê o chão, a parede, as pilastras?

                “Tudo o que é solido se esfuma no ar”. Anos depois que esta frase foi escrita e publicada dentro do manifesto comunista, o meio acadêmico e intelectual começou a perceber o quanto ela significava. É a frase que caracteriza a modernidade, a nova sociedade que nasce pós-revoluções e pós segunda guerra.
                Todas as regras que moviam a sociedade, toda a base na qual as regras estavam pautadas, assim como os pilares que sustentavam estas bases mudam e se modificam. Surgem novas maneiras de alienação social, surge uma nova forma de produção, surge um capitalismo expansionista que conquista o mundo com a facilidade que um pastor alemão se livra de um pincher.
                Não é preciso ir longe para vermos isto tudo. Basta olhar para a sociedade brasileira. Basta olhar para sua casa, ou a casa dos seus amigos.
                O senso do IBGE revelou um dado brasileiro que caracteriza esta fase de transição que vivemos – e que é característica da modernidade –, e que dela traçaremos um caminho. O fato é que o Brasil, em se tratando de matrimônios, bateu 2 recordes opostos: ocorreu tanto o recorde de casamentos quanto o recorde de divórcios. Nunca antes tantas pessoas se casaram; nunca antes tantas pessoas se separaram.
                Como pode dados opostos subirem juntos? Não seriam eles inversamente proporcionais? Alguns podem alegar que é meio obvio: se há mais casamentos, há mais divórcios, pois mais gente esta casada. Mas se pegarmos o numero de divórcios por 1000 casados hoje, ele será muito maior do que antigamente.
                E nem precisava de IBGE para saber disso. Pegue um adolescente de classe média de hoje em dia. 50% de chance dele ter pais separados (pelo menos essa é a estatística de minha classe).
                Afinal de contas, o que representa o casamento? O que representa a família? Historicamente, aceita-se o casamento como um pacto social que misturava as famílias criando assim diversidade e alianças, pactos. Isto se mostra, por exemplo, nos casamentos de príncipes e princesas entre os diferentes reinos, na época medieval, que era uma maneira de aumentar o poderio de uma família ao misturar duas famílias reais. Posteriormente, o casamento tomou o lugar religioso: é o sagrado matrimônio do catolicismo, que constitui a base da sociedade: a família.
                Mas, de repente, chega a modernidade. Tudo o que é solido se esfuma no ar. A religião, de repente, começa a perder espaço para a ciência, o consumo, entre outras formas de alienação. Os ideais, princípios, as morais religiosas começam a perder força. Ainda presentes na sociedade, elas têm suas maiores bases em gerações mais velhas, e segue a tendência de diminuir cada vez mais. O discurso religioso perde força; as aulas de catolicismo começam a esvaziar; os jovens cada vez mais preferem render-se a sociedade do espetáculo, que promete orgasmos a toda hora, do que aceitar o “velho e chato” discurso religioso. O conservadorismo da Igreja, talvez, ache dificuldades em acompanhar a história.
                Vivemos o início do vácuo, ou talvez o inicio de sua intensificação. O que tomará o lugar da Igreja? Se o consumo e o espetáculo oferecem soluções para muitos problemas, eles não podem tomar ocupar todo o vacuo: faltam neles princípios, morais, objetivos. Falta algo que de significado a vida e que de rumo a nossas ações. Por mais que todos se rendam ao imperativo do gozo – consuma, goze, consuma mais, goze mais, consuma consuma consuma consuma cosumaaaaaaaa – os recordes em venda de antidepressivos e a grande valorização e demanda por psicólogos mostra que não adianta só consumir. Em uma sociedade contraditória no mendigo de cada esquina, falta algo que signifique o consumo e a vida.
                É desse vácuo que se origina a contradição dos números de casamentos e divórcios. As pessoas ainda se casam: acreditam no amor, acreditam na família, e tem ainda algum resquício da moral da Igreja. Mas o casamento é a certeza da entrada na vida adulta – em uma sociedade que privilegia o adolescente e a juventude como ícones. O negócio é ser jovem, livre, cair na balada, se alienar com música, ecstasy, maconha, jogos, e tudo o mais que nos distrair deste mundo e nos fizer gozar. E, ao ter este imperativo repetido inúmeras vezes, as bases do casamento se rompem – não existem mais as bases que o sustentavam – elas se esfumaçaram, desapareceram no ar.
                Você tem visto TV ultimamente? Percebe o numero de propagandas que mostram a traição dentro do casamento como algo natural, e pior, engraçado? É o cara que liga pra mulher e sem querer fala que vai na balada; é o marido que chega em casa e não vê os 10 amantes da mulher fugindo. Tudo isto já está aceito no meio social: esperta é a mulher que da pra 10 caras ao mesmo tempo, e idiota é o marido que segue o casamento sem trair. Esperto é o cara que cai na balada quando a mulher não tá. E olha que engraçado, haha, sem querer ele falou pra ela no telefone! >.<
                Ok, fui pretensioso e egocêntrico durante todo o texto. Adimito isto. Mas existe, nesta construção que fiz acima, discussões e teorias interessantes, que merecem ser percebidas, discutidas e pensadas por cada um, e não apenas pelos filósofos que falam com palavras complicadas nos livros acadêmicos.