terça-feira, 17 de maio de 2011

A hipocrisia refletida no espelho

Peço desculpas para aqueles que não estudam no Equipe, pois este é um texto que talvez não faça sentido sem o contexto do cotidiano da escola.  Obrigado.




Darwin foi um genio. Ele descobriu a palavra chave para desafiar a religião e a ciência da época e buscar uma explicação inesgotavelmente plausível para a evolução dos seres humanos: diversidade.
                A diversidade é uma coisa engraçada. Ela da conta de que, dentro de uma mesma espécie, possam haver diversas diferentes entre eles. Não é genial? Os seres são iguais mas... Ao mesmo tempo, são diferentes!
                Até desenvolvermos a capacidade do pensamento cognitivo, isto não era problema. A diversidade era fundamental para garantir a seleção natural e, assim, a continuidade da espécie.
                Mas nós chegamos ao ser humano que somos hoje. Pensamos, criamos, matematizamos. Nossas mentes evoluídas são capazes de coisas incríveis. Aí, a diversidade mudou de característica. A seleção natural, se ainda tem efeito sobre os seres humanos civilizados, não dita mais todas as regras como antigamente. A diversidade criou um novo problema: o preconceito, o segregacionismo.
                Mas nós somos seres incríveis. Depois de anos de servidão; escravidão; massacres étnicos e duas guerras mundiais, a humanidade (mesmo pelos motivos errados, e mesmo que não como um todo – bem longe disto) começou a falar uma nova palavra: respeito. Foi uma evolução incrível: descobrimos que, no fundo, a ciência afirma que somos todos iguais e que talvez seja possível vivermos em sociedade juntos. Não precisamos nos amar, apenas respeitar.
                Essa é a palavra chave. Respeito.
                Há diversidade em todo lugar. E não é diversidade física, mas principalmente diversidades ideológicas; diferentes maneiras de pensar e agir. A capacidade de pensamento cognitivo trás consigo este problema: nem todos pensam igual. Problema? Na verdade, uma benção.
                Mas, cada vez mais, o colégio equipe me surpreende. Surpreende porque, quando minha classe foi viajar para Cubatão, estávamos falando sobre conceitos de Agnes Heller, uma filosofa que discutia muito sobre o cotidiano. E, lembro-me muito bem, quando eu estava em uma das grandes plenárias em que discutíamos estas questões, relacionadas com toda a desumanização e a falta de respeito que havíamos visto em Cubatão, eu olhei para trás e fiquei assustadoramente emocionado.
                Porque não foi o discurso dos trabalhadores contaminados que me emocionou. Tão pouco os discursos sindicalistas de luta de classe. Tão pouco Agnes Heller. O que me emocionou foi olhar para trás e olhar aquele bando de pessoas, cerca de 70, todas concentradas e reunidas ali em um único objetivo; discutir tudo isto. Refletir, pensar, discutir. Tomar consciência de sua própria alienação. Foi um daqueles momentos que, depois de ter certeza de que o mundo é uma bosta, você percebe que ali do seu lado estão 60 mentes em formação que pararam e se concentraram para discutir estas questões. E você pensa que, enquanto estes momentos existirem, talvez o mundo ainda possa ser um lugar melhor. E lá, tenho certeza, todos entendiam muito bem o que é respeito.
                Passado o momento, a volta para São Paulo trousse de volta o cotidiano. E o que fazemos com toda aquela reflexão, discussão, percepção que havíamos feito e construído? Guardamos para a próximo momento de discussão. Ali, no cotidiano, na escola, aquilo tudo vira lixo. Lixo inútil, sem sentido.
                Nós, 3º anistas, inclusive eu, temos SÉRIOS problemas de respeito. Não conseguimos respeitar os professores, que se esforçam para dar aula e, algumas vezes, não conseguem. Não conseguimos respeitar o trabalhador, que depois de toda a aula, é obrigado a limpar as carteiras que sujamos, o lixo que produzimos, e ainda limpar desenho de maconha do banheiro e da parede. Não conseguimos respeitar a escola, pois a maioria das situações propostas por ela são má vistas logo de cara. Não conseguimos respeitar todo o colégio, quando depreciamos o espaço público da escola com pixações e todo outro tipo de depreciamento. Não conseguimos respeitar o colega ao lado, quando fazemos barulho nas aulas, quando trocamos ofensas idiotas, quando fazemos piada de situações inapropriadas; quando não damos ouvido a alguém, quando queremos apenas procurar culpados sem sequer olhar no espelho e se desculpar. Não conseguimos respeitar todos os alunos quando furamos a fila da cantina. Não conseguimos respeitar as outras séries quando jogamos interclasses e entramos pra quebrar. Não conseguimos respeitar o segundo ano por algum tempo, com todo o rolo da festa. Em nosso cotidiano, o desrespeito parece assustadoramente normal, e esta palavra já foi invocada no mínimo por três professores..
                Isso é regresso. É involução. Não adianta ser consciente somente nas viagens de campo e aulas de filosofia. Tenho medo de usar esta palavra, mas para mim nós vivemos o cúmulo da hipocrisia.
                Outro dia, quando me recusei a ajudar alguém a furar a fila da cantina, fui chamado de moralista.
                Chamem-me do que quiser. Mas insisto: as relações construídas em nossa classe cheiram a hipocrisia, alienação, e em seu caráter mais puro, idiotice e egocentrismo.
                Respeitar é preciso.

Desabafei.

3 comentários:

  1. Minha queridissima namorada fez hj um comentario que eu acho valido. Eu generalizei demais no texto. Embora todos façam parte do grupo, falar que todo o terceiro ano age dessa forma é iginorancia. Fica ai o comentario! Valeu amor!

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  2. Embora seu texto tenha um pouco de "lavação de roupa suja", certamente tranpõe os muros do Equipe. Pra contribuir com o debate que vc propõe na primeira parte do seu texto sobre diversidade, me lembrei de uma famosa citação de um sociológo famoso:
    "(...) as pessoas e os grupos sociais têm o direito a ser iguais quando a diferença os inferioriza, e o direito a ser diferentes quando a igualdade os descaracteriza." (Boaventura de Souza Santos)

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  3. Não precisa me bajular não tá??
    Amei o texto, só essa pequena crítica.
    Beijs

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