domingo, 20 de fevereiro de 2011

A sociedade tapa-olho - Sobre a repressão do dia 17/02

A repressão do dia 17/02 aos manifestantes que faziam uma manifestação contra o aumento da passagem de ônibus e metro à frente da prefeitura em São Paulo teve uma repercussão na mídia maior que todas as outras 6 passeatas juntas. Chovem críticas a policia militar e a tropa de choque, que quebraram o nariz de um jovem e abusaram de spray de pimenta, bombas de efeito moral, gás lacrimogênio, cacetete e balas de borracha para dispersar a multidão. Na internet, a ferramenta de comunicação mais livre que conhecemos, os blogs de esquerda se deliciaram falando mal da ação policial.
Mas foi triste para mim perceber que todas as discussões virtuais sobre este tópico acabaram em argumentos do tal conhecimento popular, o senso-comum. Quanto a ação policial, “foi completamente exagerada”; “um absurdo, quebraram o nariz do moleque”; “é a força repressora desse regime ditatorial que se diz democrático”. E essas são as frases menos exageradas, que a esquerda vem repetindo a anos. Por outro lado, foi uma “manifestação de vagabundos, que não tem mais o que fazer”; “coisa de estudante revolucionário que não sabe nada”; ou “desculpa pra criar bagunça a toa”, como diriam as vozes da direita. O “posicionismo” presente nas discussões se intensifica tanto que impede qualquer discussão, resultando em uma briga de argumentos pré-elaborados contra outros iguais, e cada cabeça com a certeza que escolheu a maneira certa de interpretar os fatos. Perde-se a possibilidade de discussões realmente necessárias, como o transporte publico; o papel da policia; a interação entre política e sociedade; os movimento sociais que ganham força. Tudo isto vira uma queda de braço, um conflito, uma guerra. Mesmo que alguém saia ganhador da discussão, os dois lados só tem a perder.
Eu estava lá no dia 17, e percebi o que aconteceu. Claro que minha visão distorcerá fatos, e não se trata da verdade absoluta. Mas o que eu vi foram 600 manifestantes protestando, quando 50 deles resolveram pular a grade de contenção em frente a prefeitura. A polícia, quando percebeu que a ação era em massa, respondeu como se deve: dispersou a manifestação antes que ela representasse algum risco material a sociedade. Não da pra ficar quieto olhando 600 pessoas invadirem uma área restrita da prefeitura, pois todos sabemos como as massas – por mais justas que sejam suas causas – são perigosas.
Claro que houve exageros por parte dos policias na repressão. Mas eu – que provavelmente faço parte de uma tendência esquerdista duma parte da elite paulistana – não consigo culpar a polícia.
Dos manifestantes, 75% correram assim que começou a confusão. Os 25% que se viram no direito de enfrentar a policia (não sei bem com que armas) levaram balas de borracha e spray de pimenta na cara. Foi mal, camarada, mas encara assim a toa da nisso!
Mas bonito foi ver a imprensa sendo usada como massa de manobra pelo Movimento Passe Livre, que organizou tudo. Depois de reunir 4mil pessoas numa passeata, o movimento estava diminuindo; e, sem a vontade de deixar uma reinvidicação justa morrer, armou um protesto para dar confusão, já que a única coisa que sai na mídia é violência gratuita. Deu certo: Jornal nacional, Folha, Estadão, Revistas, Datena, tudo noticiou o ocorrido e enfureceu a esquerda caolha paulistana, que agora comparecerá em massa ao próximo protesto que ganhara mais força política e, quem sabe, terá ao menos parte da revindicação atendida. Eu – provavelmente fazendo parte da tendência de esquerda de parte da elite paulistana – não consigo culpar o Movimento.
O que entristece é ver que esse tipo de movimento social, que vem ganhando força a passos de tartaruga, não consegue problematizar para produzir conhecimento e discussões socialmente relevantes. Trata-se de uma sociedade caolha, congelada em argumentos, que esqueceu que para enxergar tudo em 3D, são necessários os dois olhos em movimento.

Por: Vitor Quintanilha Barbosa (Dreamer).

6 comentários:

  1. Foda, Vi!
    De fato, esse é o grande problema: todo mundo é meio pré-programado pra repetir aquilo que foi condicionado a acreditar. E o foda é que é cada vez mais difícil sair disso.
    Quanto ao protesto, tá certo, o MPL fez um movimento para sair na mídia, como você disse, pra não deixar uma causa justa morrer. Mas vale pensar também por que de 4 mil pessoas foi diminuindo tanto o número de manifestação para manifestação, que também inclui a desorganização e esse tipo de extremismo do próprio MPL.
    Foi uma ação meio desesperada que, realmente, não dá pra culpar o movimento, mas que ainda acho que deixa de representa boa parte dos membros da manifestação.

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  2. Concordo plenamente Tá. Não quis abortar tantas coisas assim porque não queria fazer uma analise deste caso específico, apenas sugerir que talvez tenhamos que deixar esta "pré-programação" de vez enquanto e, quem sabe, discutir para criar algo melhor.
    Mas muito bem colocado ;]

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  3. Gostei do grand finale: "Trata-se de uma sociedade caolha, congelada em argumentos, que esqueceu que para enxergar tudo em 3D, são necessários os dois olhos em movimento."

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  4. Me surpreende ainda nessa história toda um governo que não se dá ao "trabalho" de encontrar formas de dialogar com os movimentos sociais para encontrar caminhos para os impasses sociais. E se antes da polícia tivéssemos espaço para negociação?!
    Talvez assim pudéssemos/tivéssemos que descongelar nossos argumentos e posições para conseguir avançar nas reivindicações e formas de manifestações!
    Bjos e parabéns pelo blog,
    Marisa

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  5. Eu não cheguei a citar na crônica, mais o papel do governo foi mesmo escroto. Ele assumiu o compromisso de marca uma reunião depois de muita pressão dos manifestantes dentro da câmara, em uma audiência publica, mas depois não compareceu a reunião que foi marcada e disse que não haveria negociação. Foi isto que, na verdade, desencadeou a revolta e a confusão. Uma pena mesmo.

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  6. Tudo que o Vitor disse aí em cima, dupliquem.

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